Bloqueios

Caso Minerworld

Violação a normas do Código de Defesa do Consumidor

19/03/2018 | Bloqueio pedido mas negado

Em março de 2018, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul solicitou os bloqueios de download do aplicativo BitOfertas em lojas eletrônicas do Google e da Apple, de acesso ao site da Minerworld e de outros nove sites relacionados às empresas Minerworld, BitPago e BitOfertas, por violação a normas de direito do consumidor. Os pedidos não foram acolhidos no Judiciário.

DECISÃO DO BLOQUEIO

Origem da decisão de rejeição liminar de pedido de bloqueio
2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Capital (Campo Grande)
Magistrado
David de Oliveira Gomes Filho
Número do Processo
0900185-73.2018.8.12.0001
Data de julgamento
19/03/2018
Autor do pedido
Ministério Público do Mato Grosso do Sul

ANÁLISE DO CASO

Fatos

O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) entrou com ação coletiva de consumo contra a Minerworld, a BitOfertas, a BitPago e os sócios de todas as empresas (alguns atuaram ou atuam em mais de uma delas) pedindo, com tutela de urgência, o bloqueio de acesso a sites (mais de 10, listados na petição em inicial), aplicativos (BitOfertas) e páginas no Facebook e no YouTube relacionados às empresas. Além disso, o MPMS solicitou a indisponibilidade de bens e valores, busca e apreensão de documentos e bens para fins de perícia, impedimento de ingresso de novos afiliados e inversão do ônus da prova. O pedido teve por base violações ao Código de Defesa do Consumidor.

A empresa Minerworld, com sede em Campo Grande, alegadamente venderia o serviço de mineração de criptomoedas por meio de investimento inicial mínimo de seus clientes, tendo afirmado, em seu site (http://minerworld.com.br/) e em vídeos divulgados no YouTube, que possuía cerca de 70 mil investidores em 50 países. Após vários clientes começarem a denunciar a empresa pelo não cumprimento de seus compromissos, a empresa passou, juntamente com a BitPago Soluções de Pagamento e a BitOfertas Informática, a ser alvo da Operação Lucro Fácil, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Essas empresas fariam parte do mesmo plano de atuação empresarial, visto que a BitOfertas faria parte do negócio criado pela Minerworld por meio da disponibilização do aplicativo para as transações, enquanto a BitPago teria funcionado no mesmo local da BitOfertas. De acordo com o MPMS, a Minerworld seria a empresa-núcleo, enquanto as outras pessoas jurídicas seriam apenas o revestimento formal instrumentalizado para o funcionamento do sistema.

A Minerworld alega que sofreu um ataque cibernético que lhe rendeu um prejuízo na ordem de R$23,8 milhões e, por isso, atrasou os pagamentos aos investidores. Contudo, o MPMS afirma que a empresa explorou um modelo de pirâmide financeira – prática que consiste no recrutamento remunerado de pessoas de modo que, quando não houver mais entrada de “investidores”, a pirâmide quebra e os últimos ingressantes são afetados -, o qual se tornou insustentável. De acordo com o MPMS, não existem provas concretas de que realmente existe o serviço de mineração prometido, os sites da Minerworld não funcionam e a relação demonstrada no contrato da empresa oferece uma proposta fraudulenta – o consumidor investe seu dinheiro e, em um ano, sem mais nenhuma contrapartida, a Minerworld o remunera com 100% de lucro.

Assim, segundo o MPSP, a mineração serviria apenas para mascarar a pirâmide financeira, alimentada com o ingresso cada vez maior de clientes, os quais estariam completamente vulneráveis frente a uma prática comercial abusiva e ilegal. A atividade da empresa, argumentam, não respeitaria princípios basilares do Código de Defesa do Consumidor (CDC), como a boa-fé objetiva, a confiança e a lealdade, além de promover publicidade enganosa e descumprir a oferta prometida, visto que inúmeros consumidores não receberam retorno de seus investimentos.

História no Judiciário

A tutela de urgência foi deferida apenas em relação à indisponibilidade de bens e valores, à busca e apreensão dos documentos e ao impedimento de ingresso de novos afiliados no esquema, restando os bloqueios dos sites e aplicações indeferidos. Foram bloqueados R$ 1.438.217,80 das empresas e dos sócios – o que é pouco quando se vislumbra o valor da causa (R$ 300.000.000). Após essa decisão, o MP emendou a inicial para fazer novos pedidos: manter o processo em segredo de justiça e ampliar a condenação. Contudo, o juiz indeferiu. O caso segue em andamento, tendo o juiz David de Oliveira Gomes Filho da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Capital (Campo Grande) deixado em aberto a possibilidade de acatar os pedidos de bloqueio no futuro.

Fundamentos

O juiz analisou o negócio das empresas, trazendo ao processo trechos de vídeos tirados do Youtube – que convidam os clientes a adquirirem a criptomoeda “mcash” e os instruem a “administrarem” seus investimentos – para fundamentar sua decisão de tutela de urgência. De acordo com a avaliação do juiz, o sistema montado pelas empresas investigadas premia os melhores “vendedores” – que são, no caso, os clientes – com pagamento em “mcash”, viagens e carros, por meio do sistema de compra e venda das criptomoedas. A decisão relata que as empresas afirmaram ser possível, no futuro, a troca da moeda por dinheiro de verdade, assim que uma plataforma de câmbio fosse criada, embora não houvesse nenhum indício dessa iniciativa.

O juiz alegou que os fatos e o contrato trazidos na petição inicial reforçam o argumento do MPMS de que a atividade desenvolvida pelas empresas se concentra mais no convencimento dos clientes para participarem do sistema do que na efetiva prestação de serviços de mineração.

Tendo em vista que, caso a liminar não fosse deferida e a pirâmide se comprovasse ao final da demanda, os clientes dificilmente conseguiriam reaver os valores investidos, o juiz deferiu a liminar em relação à indisponibilidade de bens e valores, à busca e apreensão de documentos e bens para fins de perícia, ao impedimento de ingresso de novos afiliados e à inversão do ônus da prova. Para tanto, o juiz se baseou nos arts. 300 e 301 do Código de Processo Civil, os quais permitem o deferimento da tutela de urgência de modo que o magistrado possa tomar as “medidas idôneas para a asseguração do direito”.

Em relação aos pedidos de bloqueio do site e das aplicações das empresas, o juiz entendeu que, como nenhum dos investigados foi ouvido, as medidas deferidas com tutela de urgência seriam suficientes para proteção dos clientes. Contudo, o juiz deixa claro que, após as defesas, existe a possibilidade desses pedidos serem atendidos:

O Ministério Público, entretanto, formulou alguns outros pedidos que implicam na suspensão total das atividades das empresas requeridas. Acontece que para o momento presente, em que ninguém sequer foi ouvido previamente, nos parece que as medidas deferidas bastam para garantir proteção aos consumidores provavelmente lesados. Nada impede que, posteriormente às defesas, se for necessário, seja determinada a exclusão de links, de aplicativos das lojas virtuais ou de vídeos postados no youtube, como quer o Ministério.

VOLTAR PARA LINHA DO TEMPO